terça-feira, 20 de junho de 2017

Porque fazer-se de vítima não é uma boa opção

Olhar a própria vida requer coragem. Não é fácil recordar e reviver situações que nos causam dor e que, se pudéssemos, apagaríamos da nossa memória. O processo de ressignificar a vida necessariamente precisa passar pela lembrança dos fatos do passado e pelo contato com toda a carga emocional que tais fatos deixaram em nós e que ainda está latente. Não é raro acontecer de, ao entrar em contato com fatos dolorosos causados pelas atitudes alheias, a pessoa que passa por esse processo de recordar e reviver se coloque numa atitude de passividade perante a dor, julgando-se vítima da maldade do outro. Ao ver-se vítima de outra pessoa e das ocasiões, os fatos lhe parecem definitivamente resolvidos, dando a impressão de que seu esforço por dar um novo sentido ao que passou seja inútil, ou mesmo impossível. Porém, essa visão não corresponde à realidade; é limitadora e aponta para uma atitude resistente frente ao árduo trabalho de ver a própria vida com outros olhos para então lançar-se no projeto de um futuro qualitativamete diferente do presente sofrido.

Mas, afinal, o que realmente quer a vítima? O que essa maneira de agir perante os acontecimentos nos diz sobre suas intenções?

Podemos dizer que, consciente ou inconscientemente, a vítima quer compaixão ou a vítima quer DESRRESPONSABILIZAR-SE, ou até mesmo ambas as coisas. A vítima procura provocar compaixão nas pessoas ao seu redor quando insistentemente mostra sua dor, enfatiza a injustiça sofrida e a cada momento relembra os abondonos que viveu. Está sempre contando e recontando o quanto sua vida foi e é difícil, basta perceber a menor brecha para isso. Provocar comoção nas pessoas, no fundo, é uma tentativa de encontrar em alguém o acolhimento e o conforto que julga não ter encontrado até então; é por isso uma atitude movida por carências vivas e que causam sofrimento. Porém, agir assim não contribui nem para uma visão positiva de si mesmo, nem para uma posição ativa perante a vida; a pessoa permanece estática, imóvel perante sua dor e sua própria existência. Também é possível perceber que a vítima procura desresponsabilizar-se, pois ao delegar sempre a outra pessoa o protagonismo do que viveu, isenta a ela mesma de se responsabilizar pelos momentos ruins ou pelas metas que não foram alcançadas. Essa é uma maneira de se sentir confortável dentro das próprias frustrações, tendo em vista que se a responsabilidade não é atribuída a si próprio, o esforço da mudança se faz desnecessário.

Com isso, não queremos dizer que a culpa de todos os males experimentados recai sobre a pessoa que os vivenciou; pois existem sofrimentos que de fato são provocados pelas atitudes de um outro.

Estamos dizendo é que a forma com que se enxerga os episódios dolorosos da vida e as atitudes que serão tomadas perante eles e as pessoas envolvidas é que são de responsabilidade de cada um. É possível fazer escolhas, dar sentido e significado novo aos acontecimentos e agir de forma livre perante todo fragmento doloroso da nossa existência. Mas, para que isso aconteça, é preciso deixar o lugar de vítima e assumir uma atitude responsável pela própria história, e isso trará amadurecimento e tornará possível ter esperança no amanhã.

Gabriela Neves

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